Molas, simples e complicadas

A mola é um dos elementos mecânicos mais violentados ao modificar a altura de um automóvel. Sem entender seu princípio de funcionamento e detalhes construtivos, é difícil chegar a um bom resultado ao modificá-la.

As molas constituem o que se chama de elemento elástico da suspensão. Surgiram muito antes do automóvel, nos veículos de tração animal. Seu papel é reduzir os impactos impostos ao veículo e aos ocupantes resultantes das irregularidades do piso. Molas de material sólido funcionam sob o princípio da deformação elástica do material. Essa deformação é causada pela atuação de uma força que, uma vez cessada, faz a mola voltar a seu formato inicial.

Molas têm uma característica chamada energia acumulada por peso. A mais eficiente nesse sentido é a barra de torção, mas sua fixação numa das extremidades exige certa estrutura, o que contribui para elevar o peso do veículo. Em seguida vem a mola helicoidal e, por último, o feixe de lâminas. Este, entretanto, pode ser usado como elemento de ligação da suspensão em certos casos. Por exemplo, a suspensão traseira com eixo rígido, que ainda se vê muito em picapes e utilitários-esporte, e até em suspensões dianteiras independentes, como no DKW-Vemag e nos Fiat 500/600 dos anos 50. Há ainda a mola de lâmina única, chamada de parabólica, com bons resultados em veículos como os picapes leves Corsa, Strada e Courier.

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Há três tipos de mola: a mecânica, a pneumática (ar) e a de elastômero (borracha). As duas primeiras vêm sendo aplicadas pela indústria automobilística ao longo desses mais de 100 anos. As pneumáticas vêem-se na suspensão de carros conhecidos, como diversos Citroëns de ontem e de hoje, e para fechar as válvulas dos motores da Fórmula 1, enquanto que as de borracha são mais usadas em trem de pouso de aviões leves. Vamos ver as molas do nosso carro de cada dia.

A mencionada deformação de material se dá por flexão ou torção. No primeiro caso estão as lâminas, que podem trabalhar sozinhas ou em conjunto, sob a forma de feixes. No segundo, as barras de torção, as lâminas também e as molas helicoidais. Explicando melhor, as lâminas também podem ser deformadas por torção, a exemplo do feixe de lâminas da suspensão dianteira de Fuscas e Kombis, na maioria dos modelos, bem como nas molas espirais (corda de brinquedo e de relógios mecânicos). As molas helicoidais (confundidas como espirais) também se deformam por torção, em que cada seção do elo se torce em relação ao outro.

Um dado fundamental de toda mola é sua constante, o quanto a mola se deflete sob determinada força. A unidade mais usada é o newton/milímetro (N/mm). Colocada a mola num dispositivo, como uma prensa hidráulica com manômetro, comprimindo-a e anotando o quanto foi comprimida, estabelece-se uma relação entre força aplicada e deslocamento do êmbolo da prensa, chegando-se à constante da mola. Por exemplo, se a mola foi comprimida 10 mm sob força de 15 kg, sua constante é 1,5 kg/mm; em newtons, 14,7 N/mm.

Essa mesma mola se comprimiria em 20 mm se a força dobrasse, significando que sua constante é fixa. Mas existem molas de taxa variável, em que a força necessária para comprimi-la aumenta de maneira não-linear. Sua vantagem é proporcionar comportamento da suspensão mais uniforme independentemente da carga transportada.

Pode-se ver em picapes e caminhões um contra-feixe junto ao feixe de molas principal, uma maneira de obter taxa variável.

Molas helicoidais com formato "barril" também têm constante variável, sendo utilizadas na suspensão traseira de alguns automóveis.

Uma mola possui dois comprimentos, o livre e o de instalação. A diferença entre os dois, em milímetros, multiplicado pela constante, resultará no peso que a mola irá suportar e manter em uma dada altura de suspensão. Desse modo, é possível haver molas de diferentes constantes que deixem o carro com a mesma altura. Se um carro sai de fábrica com molas dianteiras de 18 N/mm, quem apreciar uma suspensão mais firme pode usar outra de 20 N/mm, por exemplo.

Rebaixando a mola

Quanto mais elevada a constante, mais a mola resistirá à força, portanto mais dura ela será. Dá-se o inverso com constante mais baixa. Cortar elos de uma mola helicoidal eleva sua constante, da mesma maneira que encurtar uma barra de torção. Então, ao ser cortar elos da mola com o intuito de abaixar o carro, a suspensão, além do rebaixamento, ficará mais dura. Como já se pode ver, mexer em mola requer conhecimentos.



Quando se trata de alterar a mola por aquecimento em forno, o técnico precisa retemperar a mola. Como o serviço geralmente é realizado sem a devida técnica, leva a mola a se deformar em pouco tempo, tornando-se opção ainda pior para rebaixar o veículo.


Isso é particularmente importante por ser comum muitos donos de carro, em especial os mais jovens, querer abaixar a suspensão para melhorar a estabilidade ou mesmo para um visual mais esportivo. Em muitos casos os resultados ficam aquém do esperado, podendo até comprometer a segurança veicular. Por exemplo, a suspensão ir ao batente numa ondulação do asfalto em curva, fazendo o carro saltar e os pneus perderem o contato com solo, caminho certo para a perda de controle.

A rigor, teriam de ser usados outros amortecedores, de menor comprimento, que não limitassem tanto o curso de contração da suspensão. Ou então empreender modificação na estrutura, de maneira a levantar o ponto de ancoragem superior do amortecedor.

Mas há outros problemas associados ao rebaixamento. As barras de direção passam a trabalhar inclinadas em vez de na horizontal. A direção (e o carro) fica bem mais sensível ao encontrar irregularidades no piso e pode assumir tendências inesperadas com a simples rolagem (inclinação da carroceria) nas curvas. Pode também requerer alteração da cambagem dianteira que tenha ficado negativa em excesso em função do rebaixamento -- e a maioria do carros atuais não dispõe de ajuste desse ângulo.

A mesma "desarrumação" ocorre com os braços de suspensão, que passam a trabalhar fora da inclinação original e produzem efeitos indesejados. Por exemplo, com a altura de projeto, a roda externa à curva é levada a aumentar a cambagem à medida que a roda "sobe" quando a carroceria se inclina numa curva.

Se, numa suspensão McPherson, o braço transversal passar de horizontal (ou ligeiramente inclinado para cima em direção ao centro do carro) a inclinado para baixo, a cambagem tende a positiva com a rolagem.

Parte da tropicalização de modelos destinados ao mercado brasileiro é justamente fazer essa alteração -- no caso tornar os carros mais altos devido a lombadas --, sempre precedida de projeto e testes extensos. No caso da suspensão hidropneumática do Citroën C5 é um pouco mais fácil, por requerer apenas mudança na altura de referência no programa da suspensão (o "hidro" no caso refere-se ao amortecimento, em que é usado gás nitrogênio).

Por tudo o que foi dito, alterações de suspensão, especialmente nas molas, requerem pessoal altamente especializado, devido aos diversos compromissos. Não é para qualquer um.


Por Leandro Giácomo.

Fonte:Bob Sharp

Fonte:REIS DO ASFALTO

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